O dano existencial no trabalho escravo doméstico

Autores

  • Caio Afonso Borges Universidade de Brasília (UnB)
  • Luísa Nunes de Castro Anabuki Universidade de Brasília (UnB)

DOI:

https://doi.org/10.33239/rjtdh.v8.180

Resumo

Introdução: O artigo aborda o trabalho escravo doméstico, considerados a
previsão normativa e o contexto histórico que denotam dinâmicas do
colonialismo de raça e de gênero, e apresenta o conceito de dano existencial
enquanto instituto da responsabilidade civil.


Objetivo: O objetivo é analisar o enquadramento do dano existencial a casos de trabalho escravo doméstico, em especial, os de longa duração, em que a
trabalhadora tem os direitos à educação, à profissionalização e ao convívio familiar negados.


Metodologia: Além da revisão bibliográfica, mobilizou-se a vertente
metodológica jurídico-sociológica para estabelecer um diálogo entre a
realidade do fenômeno social do trabalho escravo doméstico e o fenômeno jurídico do dano existencial, enquanto instituto da responsabilidade civil.


Resultados: Identificou-se que o dano existencial, pouco mobilizado em
ações judiciais, é importante instituto para tutelar a subjetividade de
mulheres submetidas ao trabalho escravo doméstico e pode ser usado como ferramenta para tensionar a estrutura colonial e patriarcal do Direito e da Justiça do Trabalho.


Conclusão: Em conclusão, as circunstâncias que configuram o trabalho escravo doméstico no Brasil impactam na esfera extrapatrimonial das
vítimas que implicam danos ao projeto de vida e à vida de relações, de forma
que a caracterização do dano existencial encontra estreita sintonia com a
situação das vítimas. Trata-se de recurso técnico-jurídico – pois é instituto
distinto do dano moral e visa a tutelar bens jurídicos distintos –, e também
simbólico no sentido de permitir reconhecer as origens e as razões da
permanência do trabalho escravo doméstico e que as suas consequências
recaem sobre os corpos específicos das mulheres negras. Sua utilização, a
partir de julgamentos com perspectiva de raça e gênero, pode ser compreendida como ferramenta que aponta para a descolonização do
aparato justrabalhista e para a garantia de dignidade às trabalhadoras,
cabendo ao Ministério Público do Trabalho, dada a sua atribuição
constitucional, ser um instigador desse reconhecimento.

PALAVRAS-CHAVE: colonialidade; dano existencial; Justiça do Trabalho;
trabalho escravo doméstico.

Downloads

Os dados de download ainda não estão disponíveis.

Biografia do Autor

  • Caio Afonso Borges, Universidade de Brasília (UnB)

    Mestre e graduado em Direito pela Universidade de Brasília (UnB); membro do Grupo de Pesquisa Trabalho, Constituição e Cidadania (UnB/CNPq); membro do Grupo de Pesquisa Trabalho, Interseccionalidades e Direitos (UnB/CNPq).

  • Luísa Nunes de Castro Anabuki, Universidade de Brasília (UnB)

    Mestra em Direito, Estado e Constituição pelo Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade de Brasília (PPGD-UNB), sublinha Internacionalização, Trabalho e Sustentabilidade. Especialista em Direito do Trabalho e Processual do Trabalho pelo IDP (2016) e em Direito Aplicado ao Ministério Público do Trabalho pela Escola Superior do Ministério Público da União (ESMPU/2021). Bacharela em Direito pela Universidade de Brasília (UnB). Procuradora do Trabalho (MPT).

Referências

A MULHER DA CASA ABANDONADA: Outras Tantas Mulheres. Locutor: Chico Felitti. Entrevistada: Madalena Gorgiano. Entrevistadora: Beatriz Trevisan. São Paulo: Folha de São Paulo. 06 jul. 2022. Podcast. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/podcasts/2022/07/podcast-a-mulher-da-casa-abandonada-discute-a-escravidao-contemporanea.shtml. Acesso em 26 jul. 2022.

ALVES, Adriana Avelar. Do mito do trabalho por amor à luta pela dignidade e reconhecimento do trabalho doméstico no Brasil: diálogo com a interseccionalidade entre raça e gênero. In: DELGADO, Gabriela Neves (Org.) Direito Fundamental ao Trabalho Digno no Século XXI: desafios e reinterpretações para as relações de trabalho rurais, urbanas e de serviços. V. 2. São Paulo: LTr, 2020.

ALVES, Raissa Roussenq. A herança do racismo. In: SAKAMOTO, Leonardo. (org.). Escravidão contemporânea. São Paulo: Contexto, p. 168-183, 2020.

ALVES, Raissa Roussenq. Entre o silêncio e a negação: trabalho escravo contemporâneo sob a ótica da população negra. Belo Horizonte: Letramento, 2019.

ANABUKI, Luísa Nunes de Castro. Transversalidade de gênero na agenda da política pública de erradicação ao trabalho escravo no Brasil. 2022. 169 f., il. Dissertação (Mestrado em Direito) — Universidade de Brasília, Brasília, 2022. Disponível em : http://icts.unb.br/jspui/handle/10482/46350 Último acesso em 23 de outubro de 2023.

ANABUKI, Luísa Nunes de Castro; FREITAS, Lucas Daniel Chaves de. O trabalho rural e a efetivação do trabalho digno no campo: caminhos para a erradicação do trabalho escravo contemporâneo. In: DELGADO, Gabriela Neves (Org.) Direito Fundamental ao Trabalho Digno no Século XXI: desafios e reinterpretações para as relações de trabalho rurais, urbanas e de serviços. V. 2. São Paulo: LTr, 2020.

ARRUDA, Katia Magalhães. O trabalho infantil doméstico: rompendo o conto da Cinderela. In: Revista de Informação Legislativa. a. 45 n. 178 abr./jun. 2008. Disponível em: https://www.tst.jus.br/documents/2237892/2544819/Artigo+-+K%C3%A1tia+Magalh%C3%A3es+Arruda+-+O+trabalho+infantil+dom%C3%A9stico_rompendo+com+o+conto+da+Cinderela.pdf . Último acesso em 23 de outubro de 2023.

BORGES, Caio Afonso. O dano existencial no trabalho sem pausas dos influenciadores digitais. São Paulo: Editora Dialética. 2022.

BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Embargos em Recurso de Revista 402-61.2014.5.15.0030. Relator Ministro Vieira de Mello Filho. Julgado em 29 out. 2020. Subseção I Especializada em Dissídios Individuais. Publicado em 27 nov 2021.

BUENO, Winnie. Imagens de controle: um conceito do pensamento de Patricia Hill Collins. Porto Alegre: Zouk, 2020.

CARNEIRO, Sueli. Dispositivo de racialidade: a construção do outro como não ser como fundamento do ser. Rio de Janeiro: Zahar, 2023.

CAVALCANTI, Tiago Muniz. Sub-humanos: o capitalismo e a metamorfose da escravidão. São Paulo: Boitempo, 2021.

CENDON, Paolo; ZIVIZ, Patrizia (a cura di), Il danno esistenziale. Una nuova categoria della responsabilità civile. Milano: Giuffrè. 2000. apud ALMEIDA NETO, Amaro Alves de. Dano existencial: A tutela da dignidade da pessoa humana. 2012. Disponível em: <http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/cao_consumidor/doutrinas/DANO%20EXISTENCIAL.doc.> Acesso em 18 set 2021.

COUTINHO, Grijalbo Fernandes. Justiça política do capital: a desconstrução do direito do trabalho por meio de decisões judiciais. São Paulo: Tirant lo Blanch, 2021.

DELGADO, Gabriela Neves. O direito fundamental ao trabalho digno. 2ª ed. São Paulo: LTr, 2015.

DELGADO, Gabriela Neves; MIRAGLIA, Lívia Mendes Moreira; ANABUKI, Luísa Nunes de Castro. Quando ficar em casa não é seguro: um retrato do trabalho escravo doméstico em tempos de pandemia. Abya-Yala: Revista Sobre Acesso à Justiça E Direitos Nas Américas. v. 5, n. 2, 2021.

FROTA, Hidemberg Alves da. Noções fundamentais sobre o dano existencial. Revista eletrônica do Tribunal Regional do Trabalho do Paraná. Curitiba, PR, v. 2, n. 22, set. 2013.

GOMES, Isabella Filgueiras. Trabalho Escravo doméstico no Brasil contemporâneo: contornos, características e formas de enfrentamento. In: Direitos Humanos no Trabalho pela perspectiva da Mulher. Belo Horizonte: RTM, 2019.

GONZALEZ, Lélia. Cultura, Etnicidade e Trabalho: Efeitos Linguísticos e Políticos da Exploração da Mulher. 8º Encontro Nacional da Latin American Studies Association. Pittsburgh: Encontro Nacional da Latin American Studies Association, 1979.

GONZALEZ, Lélia. Racismo e sexismo na cultura brasileira. Revista ciências sociais hoje. v.2, n. 1, 1984.

FANON, Frantz. Pele negra, máscaras brancas. São Paulo: Ubu Editora, 2020.

FANON, Frantz. Os condenados da terra. Rio de Janeiro: Zahar, 2022.

HADDAD, Carlos Henrique Borlido; MIRAGLIA, Lívia M. Moreira. Trabalho escravo: entre os achados da fiscalização e as respostas judiciais. Florianópolis: Tribo da Ilha, 2018.

HADDAD, Carlos; MIRAGLIA, Lívia; SILVA, Bráulio. Trabalho escravo na balança da justiça. Belo Horizonte: Clínica de Trabalho Escravo e Tráfico de Pessoas da Faculdade de Direito da UFMG. 2020.

HOFMEISTER, Naira. Juiz não vê trabalho escravo em caso de doméstica sem salário desde os 7. UOL. Publicada em 17/07/2023. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/reporter-brasil/2023/07/17/juiz-nao-ve-trabalho-escravo-em-caso-de-domestica-sem-salario-desde-os-7.htm?utm_source=twitter&utm_medium=social-media&utm_content=geral&utm_campaign=uol. Acesso em: 17/07/2023.

HUWS, Ursula. A formação do cibertariado: trabalho virtual em um mundo real. Campinas: Editora da Unicamp, 2017.

IPEA, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Os Desafios do Passado no Trabalho Doméstico do Século XXI: reflexões para o caso brasileiro a partir dos dados da PNAD Contínua. 2019. Disponível em < http://repositorio.ipea.gov.br/handle/11058/9538> Último acesso em 23 de outubro de 2023.

KALIL, Renan Bernardi; RIBEIRO, Thiago Gurjão Alves. Trabalho escravo contemporâneo e proteção social. Revista Eletrônica do Tribunal Regional do Trabalho da 9a Região [on line], v. 11, n. 104, p. 89-105, out./nov. 2021. Disponível em: https://www.trt9.jus.br/portal/arquivos/7133063. Acesso em: 22 mar. 2022

LEMOS, Maria Cecília de Almeida Monteiro. O dano existencial nas relações de trabalho intermitentes: reflexões na perspectiva do direito fundamental ao trabalho digno. São Paulo: LTr, 2020.

MELLO, Lawrence Estivalet de. Crise do contrato de trabalho e ilegalidades expandidas. Tese (Doutorado). Universidade Federal do Paraná, Setor de Ciências Jurídicas, Programa de Pós-graduação em Direito. Curitiba, 2020.

MIRAGLIA, Lívia Mendes Moreira. O trabalho digno como antítese do trabalho escravo contemporâneo: um retrato a partir da análise do trabalho escravo rural. In: DELGADO, Gabriela Neves (Org.) Direito Fundamental ao Trabalho Digno no Século XXI: desafios e reinterpretações para as relações de trabalho rurais, urbanas e de serviços. V. 2. São Paulo: LTr, 2020.

MIRAGLIA, Lívia Mendes Moreira; CAMASMIE, Humberto Monteiro. A permanência da senzala na casa grande: o mito da democracia racial no trabalho escravo doméstico. In: NUNES, Luísa Anabuki; CARDOSO, Lys Sobral (Orgs.) Escravidão na interseccionalidade de gênero e raça: um enfrentamento necessário. Brasília: Ministério Público do Trabalho, 2023.

PEREIRA, Marcela Rage. Breve análise do papel do afeto na perpetuação da invisibilidade do trabalho escravo doméstico no Brasil. Revista do TST. v. 88, n. 1, 2022.

PINACOTECA DE SÃO PAULO; VOLZ, Jochen. Adriana Varejão: suturas, fissuras, ruínas. São Paulo: Pinacoteca do Estado, 2022.

PIRES, Thula Rafaela de Oliveira. Racializando o debate sobre direitos humanos. SUR 28, v. 15, n. 28, pp. 65-75, 2018.

PIRES, Thula Rafaela de Oliveira. Direitos humanos e Améfrica Ladina: por uma crítica amefricana ao colonialismo jurídico. Fórum Latin American Studies Association, v. 50, n. 3, p. 69-74, 2019.

SANTANA, Raquel Leite da Silva. As cuidadoras na sala de visita: regulamentação jurídica do trabalho de cuidado à luz da trilogia de Carolina Maria de Jesus. São Paulo: Editora Dialética, 2022.

SESSAREGO, Carlos Fernández. El “daño a la libertad fenoménica” o “daño al proyecto de vida” en el escenario jurídico-contemporáneo. 2009. Disponível em: <http://www.jus.unitn.it/cardozo/Review/2008/Sessarego2.pdf>. Acesso em: 6 out 2021.

SOARES, Flaviana Rampazzo. Responsabilidade civil por dano existencial. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2009.

THEODORO, Mário. A sociedade desigual: racismo e branquitude na formação do Brasil. São Paulo: Zahar, 2022.

Downloads

Publicado

2025-04-28

Edição

Seção

Artigos em Fluxo Contínuo

Como Citar

O dano existencial no trabalho escravo doméstico. (2025). Revista Jurídica Trabalho E Desenvolvimento Humano, 8. https://doi.org/10.33239/rjtdh.v8.180